Liberação de Veículos Apreendidos com Mercadoria Irregular
- Felipe Alencar
- 10 de abr.
- 3 min de leitura
Como advogado atuante há seis anos na defesa de veículos apreendidos pela Receita Federal, já representei centenas de proprietários e empresas em todo o Brasil, especialmente em regiões de fronteira, onde as apreensões por transporte de mercadorias irregulares são frequentes. Em todos esses casos, o ponto central da estratégia é um só: a apreensão não significa perdimento automático, e o veículo pode ser liberado — administrativa ou judicialmente.
A seguir, explico todos os fundamentos que permitem a liberação legal de caminhões, automóveis ou utilitários, mesmo quando transportavam mercadorias supostamente irregulares.
1. Responsabilidade do proprietário é requisito para o perdimento
A legislação aduaneira é clara: a pena de perdimento só pode ser aplicada se ficar comprovada a responsabilidade do proprietário do veículo na infração. Essa exigência está no art. 104, V do Decreto-Lei nº 37/1966 e art. 688, V do Decreto-Lei nº 6.759/2009, e foi acolhida em decisões como:
“A pena de perdimento de veículo [...] somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade de seu proprietário na prática do ilícito.”(TRF-3 – ApCiv: 5002689-65.2022.4.03.6005)
Assim, não basta que o veículo tenha sido utilizado no transporte. É necessário demonstrar que o dono sabia ou consentiu com o ilícito.
2. Princípio da proporcionalidade: quando o perdimento é excessivo
Outra tese amplamente aceita é a da desproporcionalidade entre o valor do veículo e o das mercadorias apreendidas. Quando o bem tem valor elevado e a carga é de baixo valor, a sanção é considerada excessiva.
“a pena de perdimento só deve ser aplicada ao veículo transportador quando, além de provada a concorrência do seu proprietário para o ilícito fiscal, houver relação de proporcionalidade entre o valor do veículo e o das mercadorias transportadas.” (TRF-4 – AC: 5002425-68.2017.4.04.7210)
Esse argumento é eficaz tanto na esfera administrativa quanto judicial.
3. Medidas alternativas à pena de perdimento
A legislação prevê soluções legais que evitam a perda definitiva do veículo. Entre elas:
Fiel depositário: o proprietário pode requerer a liberação do veículo para uso próprio durante o processo, comprometendo-se a não aliená-lo.
“É cabível sua restituição ao proprietário, na condição de fiel depositário.” (TRF-4 – ACR: 3422803-03.2010.4.04.0000)
Prestação de caução ou fiança: o art. 775 do Regulamento Aduaneiro permite a liberação do bem com garantia suficiente (dinheiro, fiança bancária ou seguro).
Substituição por multa: o art. 739 do mesmo regulamento autoriza a relevação do perdimento com pagamento de multa equivalente a duas vezes o valor da multa originalmente devida.
4. Procedimento e prazos no processo administrativo fiscal
A aplicação da pena de perdimento de veículo no âmbito da Receita Federal do Brasil segue procedimento próprio, atualmente regulamentado pela Portaria Normativa MF nº 1.005/2023 e pela Portaria RFB nº 348/2023, com aplicação subsidiária do Decreto nº 70.235/1972, nos termos do art. 27-B do Decreto-Lei nº 1.455/1976.
Os principais atos e prazos do procedimento administrativo são:
20 dias para apresentar impugnação administrativa - 1ª instância (Art. 27-A do Decreto-Lei nº 1.455/1976, com redação dada pela Lei nº 14.651/2023). A impugnação será julgada pela Equipe Nacional de Julgamento (Enaj), vinculada ao Centro de Julgamento de Penalidades Aduaneiras (Cejul), nos termos da Portaria RFB nº 348/2023;
20 dias para interpor recurso voluntário - 2ª instância (Art. 27-D do Decreto-Lei nº 1.455/1976, incluído pela Lei nº 14.651/2023). Caso a decisão seja desfavorável, é possível interpor recurso, que será julgado pelas Câmaras Recursais do Cejul, conforme previsto no art. 2º, II da Portaria RFB nº 348/2023.
Se a Receita Federal não observar o contraditório e a ampla defesa, ou praticar atos por autoridade incompetente, o processo pode ser anulado:
“Art. 59. São nulos: II - os despachos e decisões proferidos por autoridade incompetente ou com preterição do direito de defesa.”(Art. 59, II, do Decreto nº 70.235/1972)
5. Restituição do veículo: por via administrativa ou judicial
A restituição pode ser obtida em dois caminhos:
Administrativamente, quando a Receita não comprova a culpa do proprietário com a infração; há desproporcionalidade entre o valor do veículo e da mercadoria; ou recebe pedido de relevação da pena.
Judicialmente, por meio de:
Mandado de segurança com liminar, quando há urgência e prova evidente da ilegalidade;
Ação anulatória do processo administrativo, quando existem nulidades ou decisões desprovidas de fundamentação;
Tutela de urgência autônoma, visando liberação provisória do bem.
Conclusão
O veículo apreendido não está perdido. A Receita precisa comprovar a responsabilidade do proprietário, respeitar os ritos do processo, aplicar sanções proporcionais e observar garantias constitucionais. Quando isso não ocorre, é possível recuperar o bem — com base na lei, na técnica e na jurisprudência.
Caso o seu veículo tenha sido apreendido com mercadoria irregular, posso analisar o seu caso e aplicar a estratégia mais adequada — seja para conseguir a liberação, substituir a pena por multa, ou anular todo o procedimento.
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